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Lições de um vírus assustador - Capa

Lançamento do livro em 14 de agosto de 2021 no Instagram @ml_heine

Link para compra do livro disponível no Instagram ou por mensagem para Maria Luiza Heine

Maria Luiza Heine

 

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A ALI, Academia de Letras de Ilhéus iniciou um projeto para publicação dos discursos de posse dos acadêmicos. Até o início deste século XXI, os discursos eram arquivados escritos, para guardar a memória e história dos acadêmicos e sua participação na vida da academia. É importante ressaltar que a ALI tem inúmeros momentos de destaque, que compõem sua história, nestes mais de 60 anos de existência. Entretanto, dois desses momentos são mais marcantes: um antes e outro depois de sua sede que, não podemos esquecer, foi uma doação da Prefeitura de Ilhéus, no governo do futuro acadêmico Jabes Ribeiro, ocorrida no ano de 2002. Desde sua fundação em 1959, as reuniões ordinárias eram realizadas na casa de alguns acadêmicos, sendo as primeiras, de acordo com depoimentos, na residência do acadêmico fundador, Nelson Schaun. Daquele tempo tenho algumas notícias, que se tornam cada vez mais raras, à medida que os pioneiros vão partindo para o andar de cima. Mesmo sem o devido conhecimento, acredito que possa afirmar uma característica que seria muito seguida, que é a de obedecer a um ritual, comum às academias de letras. É quase certo que os momentos das posses seguiam os rituais de uma importante solenidade.

Da minha posse, ocorrida em setembro de 1998, não existe discurso gravado e nem escrito; foto, só aquela que serve de ilustração à introdução desta crônica e nela não aconteceu nenhuma solenidade. Acredito que tenha sido a posse mais singular, talvez, em toda a existência deste sodalício. Já havia se passado algum tempo que a eleição havia ocorrido, quando recebi a comunicação de que a posse ocorreria naquela semana, no Salão Nobre da Associação Comercial de Ilhéus. Só estavam presentes cinco acadêmicos (Mário Pessoa, João Higino, Francolino Neto, Antônio Lopes e o quinto deles cortado na foto); o confrade Jabes Ribeiro também compareceu, mesmo não pertencendo à academia, tendo sido convidado por ser o prefeito da cidade e por prestigiar com frequência os eventos na academia. Jabes, quando viu tão pouca gente no importante evento, mandou chamar Hélio Pólvora, acadêmico e presidente da Fundaci, que alegou estar sem paletó. Jabes ligou para a Prefeitura, mandando vir o fotógrafo, trazendo um paletó que guardava no gabinete para eventuais necessidades.

No momento de fazer o discurso, quem disse, que discurso de posse? Eu não sabia que deveria fazê-lo, falei de improviso. Até aquele momento não havia assistido a uma posse na academia. Dele não se tem registro. Na minha memória ficou a enorme emoção daquele dia, a sensação de estar ingressando num espaço muito especial, num Olimpo, não de deuses, mas de “imortais”.

Aquele dia, que começou como um dia qualquer, foi um dos mais importantes da minha vida e da minha história profissional. Também deixou um momento de descontração, que não esqueço: apesar de ser um dia de semana à tarde, me arrumei toda com minha roupa mais bonita, um tailleur bege muito elegante, salto alto, meia de seda e maquiagem.

Luiza, minha sobrinha de sete anos, acostumada a me ver vestida de forma muito simples, perguntou: “vai aonde tia?”

Respondi: “para a academia”.

Ela retrucou: “tolerância zero, não, tia”.

Ela só conhecia a academia de ginástica. Dei muita risada.

Atendendo à sugestão dos meus pares, escrevi esta crônica.

Maria Luiza Heine

 

Canyon do Xingó: Paraíso da remada no sertão nordestino

Disponível em: https://www.google.com/search?q=canyon+de+xingo+fotos&rlz=1C1SQJL_pt-BRBR815BR815&tbm=isch&source=iu&ictx=1&fir=waz08WOMhfzSLM%252CL3LDsPD2zWrQXM%2

O primeiro contato que tive com o rio São Francisco ainda era menina, quando, no curso primário, nas aulas de Geografia, a professora ensinava sobre nossos rios e falou do maior rio totalmente brasileiro. Existem coisas que ficam em nossa memória, apesar de tanto tempo passado. Lembro que ela nos contou que, na expedição capitaneada por Américo Vespúcio em 1501, os navios rumavam na direção sul, reconhecendo as terras encontradas e nomeando os pontos geográficos com o nome do santo do dia. Dessa forma, a passagem da expedição pela foz do rio, cujos habitantes da terra chamavam de Opara, cujo significado – rio-mar – se deu em quatro de outubro de 1501, data do nascimento de São Francisco, o santo italiano da igreja católica, nascido em Assis. Pouco tempo depois, na continuação da expedição, ao conhecer a baía encontrada mais ao sul em primeiro de janeiro, deram-lhe o nome de Baía de Todos os Santos, data comemorativa no calendário litúrgico católico.

Esta aula sobre o rio da “integração nacional” me trouxe um conhecimento que perdura até os dias atuais, acrescido de muito amor e respeito àquele rio. Pessoalmente só fui conhecê-lo no final dos anos 1960, já casada, quando tive oportunidade de ir a Juazeiro e Petrolina. Conhecer aquele rio enorme, passar sobre a ponte que une as duas cidades provocou em mim uma grande emoção, levando-me às aulas da minha infância. Jamais esquecerei que, ao atravessar a ponte, de um lado o sol se punha, do outro, a lua nascia, ambos se espelhando no majestoso leito do rio.

Se existem palavras que posso expressar sobre o que este rio desperta em mim, posso dizer: respeito, admiração, gratidão pela sua existência, e muito cuidado e temor para que não seja destruído.

Não tive muito contato com o rio, mas, ao longo da minha existência, todos os contatos que tive estão muito bem guardados em minha memória. Antes mesmo daquele que citei acima, quando da minha viagem a Juazeiro, lembro da primeira vez que saí do Rio com meus pais para conhecer Brasília e, na cidade de Três Marias, conheci seu lado mineiro, tendo ficado maravilhada, apesar da pouca idade, quando vi a placa dizendo que iríamos passar pela ponte “sobre o Rio São Francisco”. Tantos anos se passaram e as lembranças tomam conta do meu pensamento e do meu coração. Tempos depois, nos anos oitenta, saí de Ilhéus de carro, para curtir férias, indo até João Pessoa, na Paraíba. Chegando à cidade de Propriá, em Sergipe, me deparei com aquela ponte enorme, que nem precisou de aviso: eu já estava esperando a passagem para Alagoas, na expectativa de rever meu querido amigo, o Velho Chico que, certamente jamais foi para mim, um rio qualquer, mas o rio da integração nacional, o maior rio totalmente brasileiro.

Sobre isso, assim se expressa Machado[1]: “O rio São Francisco, denominado ‘rio da unidade nacional’ representa a força de todas as correntes étnicas do Brasil, porque uniu as raças desde as camadas humanas mais antigas às estruturas étnicas e políticas mais recentes do país”. Aproxima o sertão e o litoral, integrando homens e culturas. E é isso que o rio representa para mim; é isso que me faz tão próxima dele.

Como tenho uma consciência ambiental muito forte, muitas coisas me preocupam, embora entenda que minha ação é muito pequena. A transposição do Velho Chico me deixou bastante preocupada, tendo sido solidária ao Frei Luis Cappio, e contrária à transposição; também a irrigação, que proporcionou tanta abundância no seu entorno, me preocupou. Hoje moro em Aracaju, estando mais próxima do enorme manancial, que fornece água para muitos locais do Nordeste. A água que chega às minhas torneiras, procede do Velho Chico, as maravilhosas uvas, mangas e melões que vêm para minha mesa são produzidos pela agricultura irrigada em Petrolina e Juazeiro. Esta semana ouvi uma notícia que me deixou imensamente feliz, tendo me motivado a escrever esta crônica: depois de dez anos sofrendo e diminuindo seu volume, por conta da estiagem, deixando o mar entrar nos seus domínios, o rio São Francisco, subiu seu nível em mais de 80%, voltou a ser o que já foi um dia. Espero que possamos cantar como Gonzagão cantou:

 

Riacho do Navio

Corre pro Pajeú

O rio Pajeú vai despejar

No São Francisco

O rio São Francisco

Vai bater no meio do mar

O rio São Francisco

Vai bater no meio do mar.

 

Vamos cantando e lutando para que a Terra dos Homens, que não é dos homens, mas de todos que nela habitam, possa lutar para que a biodiversidade seja respeitada e, principalmente preservada.


[1] MACHADO, Regina Coeli Vieira. Disponível em: http://basilio.fundaj.gov.br/pesquisaescolar/index.php?option=com_content&view=article&id=225.

Importância da Filosofia

Maria Luiza Heine

Há 25 séculos o homem descobriu o seu pensamento e o saber!

É difícil de poder imaginar a sensação que o homem foi sentindo quando descobriu, ou melhor, quando concretizou esta descoberta – sou diferente dos animais, eu penso! Foi como se uma grande luz tivesse sido acesa sobre a cabeça de cada ser humano. Foi como se só então ele passasse a enxergar.

Lentamente foi evoluindo, de descoberta em descoberta, de caminhada em caminhada. A filosofia, termo que foi usado inicialmente para designar o amor ao saber, passou a ser com Aristóteles a totalidade do saber. Era filósofo todo aquele que tinha um grande conhecimento, que sabia mais e que descobria as coisas. Todo sábio era um filósofo.

Com a descoberta da ciência e a sua afirmação depois do século XVII, as diversas ciências foram se desligando da filosofia e o que parecia um empobrecimento, passou a ser na realidade um aprofundamento.

No ano 300 a.C., a Matemática já constituía uma ciência à parte; na Idade Média, a Teologia se desligou, e depois do século XVII, a Física, a Química, a Biologia e mais recentemente a Psicologia e a Sociologia. Segundo Morente estuda-se na Filosofia o que restou do desmembramento. Bertrand Russel diz que a ciência estuda o comprovável, o que pode ser experimentado; a Teologia estuda os dogmas e o que se aceita por adesão, mesmo sem comprovação. Entre os dois campos, existe uma terra de ninguém. Este é o campo da Filosofia.

Nesta caminhada lenta do homem, caminhada lenta, mas sofrendo sempre uma aceleração, chegamos ao século XX, o século da aceleração máxima, das grandes realizações. Nos últimos cem anos o homem evoluiu mais do que em toda sua história. A ciência faz coisas “que Deus duvida”. Há até quem diga ele passa de “homo sapiens” a “homo cosmicus”. O universo já não representa um mistério insondável, as doenças vão sendo dominadas e uma grande confusão se faz no pensamento do homem enquanto indivíduo.

Se por um lado americanos e russos chegam à lua, por outro, o índice de analfabetismo aumenta. Se as doenças são dominadas e não matam tanto, 3 bilhões de irmãos nossos morrem de fome. A ciência domina tudo, explica “tudo”. Cada vez se coloca mais fé na capacidade do homem e nas possibilidades da ciência. Pensar, sonhar, criar, amar, vão ficando em segundo plano e desprezados pelos homens importantes.

E assim, nesta evolução, não se sabe se o homem caminha para o ápice ou para o caos. Se existe máquina para substituir o trabalho humano, se com todos estes inventos, a sua vaidade vai sendo satisfeita, ele aos poucos vai se transformando em engrenagem desta “máquina”.

Com a desvalorização do ser humano como pessoa, como indivíduo, nascem os grandes monstros da atualidade: a angústia, o temor, a solidão, o nada. O homem se sente ator e autor do seu próprio destino e, ao mesmo tempo, um miserável átomo neste imenso universo.

Todo o histórico que fiz, mostra que o homem passou de indivíduo, único no universo, para uma parte de um todo. E isto, ao invés de lhe trazer a felicidade, leva-o ao desespero. Daí a grande importância da filosofia na atualidade. A filosofia não massifica e não impõe como a sociedade de consumo.

Para encontrar a felicidade, o homem precisa se conhecer e se encontrar. E isto ele só consegue filosofando, se perguntando, tentando descobrir sozinho o sentido de cada passo que dá na vida.

É preciso se buscar o saber por estímulo interno e não por algo que se impõe. É por uma necessidade de filosofar que o homem se torna mais homem, parte de um todo, é claro, mas parte insubstituível no plano total, único, e único capaz de descobrir o destino do mundo.

No ser humano encontra-se toda uma riqueza escondida, riqueza esta que poucos chegaram a descobrir. Mas esta riqueza não faz dele mais sábio porque acumulou conhecimentos como um computador eletrônico, e sim porque faz ele descobrir sua capacidade individual de transformar o mundo, construindo-o.

Se as diversas ciências estudam o homem objetivamente, explicando tudo, a filosofia continua estudando o homem em sentido mais global. A filosofia dá um sentido mais amplo, mais subjetivo no sentido de humanidade, mas mais objetivo no sentido do homem como pessoa.

A ciência é para servir ao homem e não, como se vem pensando, o homem para servir à ciência. A humanidade continuará existindo com seus valores, na medida em que o homem descobrir a necessidade de filosofar.

Este texto foi escrito em abril de 1977, quando iniciei meu curso de Filosofia na Fespi (Federação das Escolas Superiores de Ilhéus e Itabuna), hoje Universidade Estadual de Santa Cruz (UESC). Foi escrito para atender à solicitação da professora Helena dos Anjos, de Introdução à Filosofia I, em sua primeira avaliação da disciplina. Com o texto não fui somente avaliada, mas verdadeiramente introduzida no curso de filosofia.

Maria Luiza Heine

O dia era 16 de março de 2020. Uma segunda-feira como outra qualquer, início de semana para uma professora universitária, seus colegas e seus alunos. Tudo parecia normal e, como em Aracaju no dia seguinte seria feriado, comemorando o aniversário da cidade, os alunos faziam contato querendo saber as haveria aula, mesmo sabendo que naquela universidade não existe o hábito de “enforcar” dia imprensado pelo feriado.

Os planos da professora era não faltar a nenhuma aula para finalizar o período no tempo certo. Mas, a primeira lição que se tira dos fatos ocorridos, é que os planos são necessários para se atingir uma meta; o que não significa que vão ser cumpridos, é possível a qualquer momento ter que modifica-los, trocá-los por outros completamente diferentes.

Retornando um pouco no tempo e fazendo uma rápida pesquisa na internet, é possível saber que o denominado corona vírus, por ter o formato semelhante ao de uma coroa, começou a atuar na China, mais precisamente na cidade de Wuhan, província de Hubei, no início de dezembro de 2019, mas só foi reportado no final daquele mês e ano. O mundo acordou festejando 2020 em meio a essa notícia que poucos ficaram sabendo, por conta dos festejos do ano que se iniciava. Aos poucos fomos sendo informados de um evento que acontecia na China, a milhares de quilômetros de Aracaju. Nosso primeiro sentimento é o de minimizar o fato. Ora, é do outro lado do mundo, não vai chegar aqui.

Se a notícia chega rápido, o vírus nem demora tanto; aviões e navios com seus passageiros se encarregam de fazer o transporte. E assim, o mês de março viu o grande vilão do momento fazendo estragos por toda parte. Na Itália, país com pouco mais de 60 milhões de pessoas, a situação chegou à casa do absurdo, com milhares de pessoas mortas, inclusive médicos e enfermeiros que trabalham na linha de frente; depois foi a vez da Espanha e Estados Unidos. E agora, ninguém escapa de sofrer com muitas pessoas doentes e muitas mortes.

No Brasil, o primeiro vírus foi detectado em São Paulo, em um senhor que veio da Itália e o aumento dos infectados cresce em progressão geométrica; já eram mais de 100 mortos e mais de 2 mil infectados em 29/03. Hoje, dia 08/04 já evoluiu para quase 16 mil casos e 800 mortes. Amanhã, certamente estes números, infelizmente, já foram superados.

Para conter a pandemia, os governos da maioria dos países decretaram o fechamento do comércio, das escolas e universidades, portos, aeroportos e rodoviárias. É necessário fazer o isolamento social, para que não aconteça o que aconteceu na Itália, Espanha e Estados Unidos. Todos que puderem deverão ficar em casa, apesar das opiniões em contrário.

Os filmes que mostram as maiores cidades do mundo, mostram cidades fantasmas, sem carros e sem pessoas na rua. Aquele 16 de março de 2020 foi meu último dia com meus alunos. Depois dele parece que a Terra parou. E eu me lembrei da música de Raul Seixas.

 

Essa noite eu tive um sonho
De sonhador
Maluco que sou, eu sonhei
Com o dia em que a Terra parou (bis)

Foi assim
No dia em que todas as pessoas
Do planeta inteiro
Resolveram que ninguém ia sair de casa
Como que se fosse combinado em todo o planeta.
No dia em que a Terra parou.

E aquela segunda-feira de março foi a última aula antes da Terra parar. E parou por decreto governamental, e parou de medo do inimigo invisível, que chega sem avisar.

A universidade onde trabalho em Aracaju (Unit), implementou um curso de aula remota e estamos todos, professores, alunos, diretorias e técnicos, atuando em casa, não deixando o trabalho parar, mas devidamente protegidos em nossas casas.

A Terra parou, as cidades estão vazias, as pessoas estão assustadas e com medo; apesar disso, muitos pensam que não é nada demais, apenas uma “gripezinha”. Desde o início, em dezembro de 2019, até hoje, já existe quase 1 milhão e meio de pessoas infectadas, a maioria já curada, é verdade, mas, mais de 86 mil delas, já deixaram o planeta.

E eu não tenho resposta para meus alunos, nem para Leticia, sobre até quando vamos ficar em isolamento social, em quarentena.

 

MILAO

ESTÃO ABERTAS AS INSCRIÇÕES

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MAIORES INFORMAÇÕES – EDITAL NO SITE DA UESC

Quer saber quem foi Sosígenes Costa?

https://ilheuscomamor.wordpress.com/?s=sosigenes+costa

O RIO DA MINHA INFÂNCIA

 

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A morte do Museu Nacional do Rio de Janeiro, na Quinta da Boa Vista, me deixou em estado de choque, e foi mexer com alguma coisa que deixei lá no passado longínquo, no tempo da minha infância e adolescência. Lembrei então de meu querido pai, um pai muito duro, mas também, muito amoroso e presente, que me ensinou coisas que nenhuma escola foi capaz de fazê-lo

Nos anos 1950, criança ainda, aprendi segurando a mão do meu pai a conhecer o Rio de Janeiro, a amá-lo e a admirar sua beleza. Morávamos no Flamengo, na rua Senador Vergueiro, próximo à Paissandu e ao Catete. Papai trabalhava no Centro e eu adorava passear por lá com mamãe e Silvinha, minha irmã, tomando o bonde que passava na minha rua. Curiosa e bem orientada geograficamente, decorei o nome de suas ruas, tomei muita laranjada no Edifício Avenida Central, comendo pastel. Nunca esqueci o sabor.

Nos finais de semana papai nos levava para conhecer lugares mais distantes, tais como a Quinta da Boa Vista, seus parques e lagos, o Jardim Zoológico e o esplendoroso museu, cujo palácio havia sido habitado pela Família Real Portuguesa e por nossos príncipes, Pedro I e seu filho, o grande imperador do Brasil D. Pedro II.

Muito pequena ainda não compreendi toda a sua grandiosidade, e mais, o enorme valor do seu acervo, cuja idade variava entre os 12 mil anos de Luzia, o mais antigo fóssil humano encontrado nas Américas, e muito mais: as múmias do Egito, o trono do rei africano, muitas peças de arte indígena, seus quadros, além de enorme material de pesquisa e papéis que falam da nossa história, tudo isso abrigado em um prédio belíssimo, que hoje tem 200 anos que foi construído. Não faço ideia de quantas vezes estive lá na minha infância, até porque meu pai adorava fazer este passeio para levar os baianos que nos visitavam no Rio.

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Muitos outros lugares conheci levada pela mão de meu pai. Eu adorava quando ele inventava um pic-nic. Normalmente levávamos sanduíche de atum e frango assado com farofa, refrigerantes e muitas frutas. Papai adorava frutas. Fizemos muitos pic-nic’s sentados na relva dos parques da Quinta da Boa Vista, hábito muito comum ao carioca, ainda nos dias atuais. Mas adorávamos, eu e minha irmã, quando o passeio era na Barra da Tijuca, na praia. Ainda não havia o túnel atual e tínhamos que subir a sinuosa estrada do Joá. De lá muitas vezes subimos para a Floresta da Tijuca e parávamos na Vista Chinesa, na Mesa do Imperador, na Cascatinha e em muitos outros lugares que visitávamos sem nenhum medo. Hoje não tenho mais coragem; o Rio mudou demais.

A paixão do meu pai era o futebol e, mais que isso, o Flamengo. Durante muitos anos da minha infância saímos de casa aos sábados ou domingos para assistir nosso time jogar. A maioria das vezes nosso destino era o Maracanã, imponente e maravilhoso com quase o triplo da capacidade atual. Mas conheci os campos de Álvaro Chaves (Fluminense), General Severiano (Botafogo), São Januário (Vasco da Gama), Campos Sales (América) e até o Caio Martins em Niterói, do Canto do Rio. Nada disso sai da minha memória, agora com um gosto enorme de saudade.

O incêndio do Museu Nacional me trouxe todas essas lembranças. Voltando ao início da conversa, estive lá muitas vezes, mas foi na minha breve passagem pelo curso de Arquitetura que o conheci muito melhor, em uma visita guiada com a presença de um professor.

A última vez que o visitei foi em 2001. Saí de Ilhéus com a finalidade de levar minha neta Luiza, então com cinco anos, para conhecer a “Cidade Maravilhosa” e suas atrações turísticas e culturais. Foram poucos dias de intensas atividades, mas não faltou a ida ao Museu da Quinta da Boa Vista. Ela estava acostumada a ver filmes de múmias, meteoritos, dinossauros. Lá ela pode ver tudo isso “de verdade”. Não era ficção e foi uma aventura maravilhosa, também para mim, que pude explicar-lhe muita coisa.

 

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Sobre as múmias, ela olhou, olhou e perguntou: é gente? Ficou impressionada com o tamanho dos esqueletos dos animais pré-históricos. Mas, de tudo, o que mais lhe chamou a atenção foi o meteorito de Bedengó. Depois de olhá-lo de várias formas, me perguntou: vó… posso tocar? E, quando consenti que o fizesse, ela se mostrou muito surpresa, dizendo em tom de decepção: é frio… (diferente dos filmes que assistia).

Tudo isso retornou à minha memória e o sentimento foi de tristeza, sabendo que quase tudo havia se queimado, em poucas horas se transformara em cinzas.

Em que pese as ordens do presidente, e a promessa de “recuperar tudo”, não sei o que é esse tudo. E nem qual é o seu poder.

É com muita tristeza que afirmo: do Museu de História Natural da Quinta da Boa Vista e do Rio da minha infância não existe mais quase nada.

 

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(As fotos foram recebidas pelo WhatsApp – os autores se manifestando receberão os devidos créditos)

O MENINO HANS

 

Maria Luiza Heine

No dia 18 de outubro de 2010 escrevi uma crônica sobre o Chocolate Caseiro de Ilhéus, que dizia o seguinte:

Gostaria de começar esta matéria como um conto de fadas: “Era uma vez um menino que resolveu criar uma fábrica de chocolate na terra do cacau…”

Sim, um conto de fadas que se tornou realidade 60 anos depois que o cacau se tornou a principal fonte de renda do estado da Bahia. Sempre me perguntei por que, com tanto cacau, não se produzia o chocolate? Por qual motivo a fábrica de chocolates Garoto se instalou no Espírito Santo e não aqui? Desde que comecei a estudar a história de Ilhéus, estas eram perguntas que eu me fazia e nunca encontrei respostas.

Mas, eis que, há 25 anos, um menino empreendedor, um ilheense nascido em Salvador, chegou para redimir nossos antigos coronéis (empreendedores); eles ganhavam tanto dinheiro vendendo os caroços secos, e não pensaram que o fim de toda monocultura é melancólico.

Nas palavras do “menino” Hans: A ideia da construção da primeira fábrica de chocolate da Bahia surgiu logo após a inauguração do nosso Ilhéus Praia Hotel, em junho de 1981, quando a cidade comemorava seu centenário. Os turistas que chegavam ao Hotel, vindos principalmente em ônibus do Rio e de São Paulo, nos faziam a pergunta mais óbvia do planeta: “Como a cidade que mais produz cacau no Brasil não tem uma só fábrica de chocolate, quando no Rio Grande do Sul, principalmente na Serra Gaúcha, existem várias e lá não existe o cacau?”

A pergunta foi o desafio que o levou a pesquisar, em viagens a Gramado, a Blumenau e Joinville, e, posteriormente, à Europa (Suíça, Alemanha, Itália e Bélgica), sempre estudando as fábricas existentes, seus métodos e produtos.

Ao voltar da viagem à Europa, Hans já havia traçado o projeto da futura fábrica, iniciando sua construção em 1984, e inaugurando em 1985, após cursos feitos na Chocotec e Ital, em Campinas (SP). O governador do Estado à época, João Durval Carneiro, veio a Ilhéus inaugurar a fábrica, considerando o pioneirismo do empreendimento.

Foi com tristeza que recebi a notícia da partida do menino Hans. Suêde, muito triste, me pediu que escrevesse algo sobre ele, e foi então, que me lembrei desta crônica publicada no Diário de Ilhéus e no meu blog ilheuscomamor.wordpress.com.

Quando a crônica foi publicada Schaeppi me ligou dizendo: Maria Luiza quem está falando é o menino Hans, e deu uma larga risada. Ele ficou feliz com o que escrevi e me agradeceu. Perdi um amigo, um companheiro do turismo, da época que tinha pousada, um confrade da Academia de Letras. Ilhéus perdeu muito mais: um filho nascido em Salvador, mas que amava esta terra como sua, a quem dedicou toda a sua vida.

A triste realidade é que todos seguiremos por este caminho inexorável. Acredito que sua chegada por lá deve ter sido motivo de muita alegria.

Vá em paz, menino Hans! Você cumpriu sua missão.

 

Convite lançamento livro

 

  Não estamos preocupados com a salvação do planeta. A Terra já sobreviveu a cinco extinções em massa, a última delas a que acabou com os dinossauros, há 65 milhões de anos, e vai sobreviver se o modo de vida humano causar nova extinção em massa. O assunto não é se preocupar com o fim do mundo, mas encontrar formas de preservar a capacidade da Terra de sustentar uma civilização próspera e moderna. (Anthony Cortese)

 

Este livro tem como base minha Tese de Doutoramento, realizada na Universidade do Estado da Bahia (UNEB), defendida em 2013. O tema trata da Educação Ambiental, como forma de despertar nas pessoas o interesse em modificar suas práticas e assim, tentar reverter o quadro de desolação que assola o meio ambiente do planeta Terra.

Podemos afirmar que o século XX conheceu a maior transformação já ocorrida no planeta, depois da existência da história escrita. Transformação em muitos sentidos, no que se refere à técnica e tecnologia, aos costumes, aos valores e, principalmente e inclusive, no que se refere à humanidade. Quando se pensava na possibilidade de uma convivência mais harmoniosa, numa evolução espiritual, o que se tem visto neste início de século é um estado de guerra mais exacerbado; a intolerância aflorou de tal forma, que passou a se constituir em estado de risco permanente, onde a possibilidade de extermínio da vida se tornou viável, somando-se àquela já percebida dos problemas ambientais.

Nossa preocupação com as questões chamadas ambientais surgiu, de certa forma, tardiamente, posto que, enquanto muitos ambientalistas insistiam no assunto desde o início da segunda metade do século XX, passamos a enxergar o problema somente no final daquele século.

O que nos levou à pesquisa que deu origem à nossa tese surgiu com a nossa prática pedagógica nas aulas de Gestão Ambiental, por volta do ano de 2008, no Curso de Administração da Faculdade de Ilhéus (BA). Nessas aulas, percebemos que os alunos do 7° período estranhavam a inserção da disciplina em um curso cuja finalidade era orientar como administrar empresas que, provavelmente, estariam na zona urbana. Aqueles alunos ainda pensavam que meio ambiente trata apenas da natureza, das florestas, dos rios e dos animais. As pessoas e o meio ambiente urbano não estariam nele incluídos.

Por outro lado, no iniciado século XXI já se percebia a necessidade dos seres humanos enfrentarem os graves problemas relacionados às questões ambientais, produzidos pelos avanços tecnológicos e pela marca alcançada de sete bilhões de habitantes humanos desejando tudo o que é produzido pelo capitalismo e oferecido pela sociedade de consumo. Já havia um movimento buscando a preservação ambiental, posto que, está escrito na Constituição Brasileira de 1988 que, usufruir de um meio ambiente ecologicamente equilibrado é um direito de todos, e é dever do poder público e da coletividade defendê-lo. Também nos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs), sobre o Meio Ambiente, está posto que, “de onde se retirava uma árvore, agora retiram-se centenas. Onde moravam algumas famílias, consumindo alguma água e produzindo poucos detritos, agora moram milhões de famílias, exigindo imensos mananciais e gerando milhares de toneladas de lixo por dia” (p. 174). Afinal, já somos sete bilhões de habitantes no planeta; e por conta da mentalidade criada pelo capitalismo e pela globalização, cada vez mais crescem nossas necessidades de alimentos diferentes, de mais água, de retirar do planeta aquilo que necessitamos; mas não podemos esquecer que o futuro da humanidade e da vida no planeta depende da relação que o homem estabelecer com a natureza, e de como ele utiliza os recursos naturais disponíveis.

 

 

Livro

 

Estarei lançando este meu novo livro, que retrata parte da minha tese de doutoramento, no dia 13 de novembro em Ilhéus, na Academia de Letras – ALI.

 

Meu livo

Disponibilizarei maiores detalhes posteriormente